Pluto ao vivo no Bons Sons… a banda que andava tão perdida mas que ainda conseguiu ser feliz para sempre

Ainda enfeitiçados pelo concerto a que acabámos de assistir, seguimos agora – praticamente a levitar porque o efeito Aldina não passa assim tão facilmente – até ao palco António Variações (não há festival nenhum no mundo que tenha palcos tão incríveis como o Bons Sons!) para assistir ao mega regresso dos Pluto.

E de alguma maneira parece que continuamos em casa…  (portuguesa, com certeza!)

Casa essa que não demorará muito a vir abaixo…

Já se passaram vários meses desde a mítica ressurreição dos Pluto, que aconteceu no passado mês de Janeiro, nessa festa de aniversário que virou festival, de seu nome “O Salgado Faz Anos”, nos Maus Hábitos do Porto. Desde então que a banda da invicta tem andando num espécie de mini-tour. Tour que “descansa” agora em Cem Soldos. A expectativa é enorme! A emoção também. A plateia então nem se fala… Um enchente monstruosa (perdoem-me a referência Ornatos, mas não deu mesmo para resistir…) de cabeças e braços no ar “é tudo o que eu vejo”.

E eis que Peixe, Ruca, Manel Cruz e Eduardo Silva e entram no palco acompanhados por uma ruidosa ovação e por um mar de corações (improvisados com as mãos) ao alto. “Que lindo!” diz o vocalista (que dispensa apresentações) e que nos cumprimenta com um nortenho “Boas pessoal!! Tá tudo?” ao qual todos respondemos em conjunto com mais um barulhento aplauso.

Tá tudo! Tá mais do que tudo! E tá tudo morto por um bocadinho de Rock n Roll! (essa coisa que é provavelmente a melhor do mundo como dizia um certo peixe…)

E é precisamente esse mesmo Peixe quem abre as honras da casa e dá inico á festa! Com a sua guitarra (que nos parece no volume máximo) dá o mote para a única (mas mesmo única!) música que poderia abrir este concerto, este regresso, esta celebração.

Estamos de volta ao teu bom humor! Sempre essa ideia na mente! É para lembrar o motivo! É que hoje eu sinto-me vivo! E seja por que motivo for, por  que motivo for, por que motivo for! É só mais um começo com teus dentes no chaaaaaaaaaaao!” são as palavras entoadas pelo público num uníssimo perfeito com o Manel e numa alegria contagiante. Palavras que parecem ter sido escritas á medida para descrever o dia de hoje…

Como que num segundo cumprimento da noite, os Pluto dão-nos as boas-vindas a nós próprios, com a maravilhosa “Bem vindo a ti” que tão bem representa aquilo que este projeto é: Rock (mais) puro e (mais) duro. Sem nunca descurar a Poesia! Ou não fizesse parte da banda um tal de Manel Cruz… Que nos regala com pérolas como “Não existe o fim do que existe em nós / Nunca vês o fim do que existe em nós / Somos nós o fim do que existe em nós”.

Obrigada pessoal! Até á próxima!” provoca o poeta de São João da Madeira levando a uma gargalhada geral. Mas uma gargalhada nervosa… Porque ninguém quer arredar pé… Ainda há muito “para ver e fazer”! Não se brinca com coisas sérias Manel…

Um ótimo exemplo das tais coisas que ainda queremos ver e fazer é a música que se segue. Que nem é bem uma música, é mais um hino… Dos mais energéticos de que o Rock  português tem memória. Prova disso é a devoção (devidamente acompanhada de vigorosos headbangs) com que o público berra que “eu não conto a ningueeeeeeeeeeeeeeeem!!”.

Ainda bem não havia de facto segredo nenhum para guardar, porque se houvesse teria sido ouvido na Lua…

E embora tenha sido bonito de ver, não deixa também de ser curioso de observar que foi preciso falar d’“A vida dos outros” para Cem Soldos vir abaixo. Mesmo sendo o poema uma gigante ironia. É curioso. Somos mesmo portugueses…

Continua forte a festa, agora “Entre nós”, e fica com este tema provado que é precisamente com os Pluto que o Manel consegue mostrar melhor o verdadeiro rockstar que é – pausa dramática para todos os fãs de Ornatos me caírem em cima – mas é a verdade! Principalmente á guitarra! Com Pluto Manel mune-se, quase sempre, de uma Fender vermelha e dá-lhe um uso como eu nunca o vi dar antes. (Nem com Ornatos! Nem a solo. Nunca!) Tanto que na parte final desta música o Manel demora num riff (repetido ao expoente da loucura) em loop que faz as delícias do público.

Antes da próxima música somos solenemente avisados que “esta é uma “nova antiga”, é tipo a virgindade: ainda não foi editada!” Mas não é por não ser conhecida do público que é recebida com menos entusiasmo… Desta vez o Manel deixa a guitarra e volta á sua “posição original” da postura curvada, quase corcunda, a condizer com o fio enrolado do micro, com que expulsa a sua Poesia, quase como se a estivesse a vomitar. Típico. Poético até…

A nostalgia do “Bom Dia” continua com “Sexo mono” e “Segue-me à luz”. Enquanto isso, dou por mim a constatar algo bastante perturbador sobre este concerto. O Manel ainda tem a roupa toda vestida! Algo está muito errado…

Nem de propósito, depois de nos anunciar que a próxima música será “uma nova antiga que fala de coisas que rolam , ou seja de tudo”, eis que o Manel tira finalmente a t-shirt. “Não há verdade que não role” canta freneticamente passeando-se em tronco nu pelo palco. Agora sim está tudo certo!

E eis que a guitarra do Peixe começa a fazer uma magnética introdução, que todos nós reconhecemos, como que para nos relembrar de que “O 2 vem sempre depois”. Não que fosse preciso… Pelo efusivo coro com que o público responde a lição está mais do que sabida! “Mas tem de ser bom / Meu prazer teu e teu prazer meu / Mas tem de ser bom” são repetidos num sarcástico embalo até que culminam num abraço entre o Manel e o Eduardo.

Os Pluto continuam numa de nos dar lições, desta vez de adição, e mais uma vez, o Manel perde a guitarra e desata a correr pelo palco parando nas posições mais estranhas, o que conjugado com o raw power da banda, deixa o público a vibrar de entusiasmo.

Naquele que fez o momento mais introspetivo e atual da noite (em todos os sentidos) o vocalista começa por contar-nos que “esta (música) sim é nova! Chama-se Túnel. Porque foi a primeira coisa que me veio á cabeça.” Num tom um pouco mais sério continua explicando que “fala daquela energia que está sempre lá, podemos usá-la para a violência ou para a criatividade, mas ela está sempre lá”. And just like that, bem ao estilo subtil do Manel, ficou tudo dito… Sem nomes, sem acusações, sem polémicas. A mensagem passou na mesma.

“Chegamos ao fim, mais um brinde!” ouvimos o Manel dizer de copo na mão. E desta vez sabemos que é a sério.

O concerto termina de forma tão perfeita como começou. Com uma música que, tal qual como vimos acontecer no início, parece ter sido escrita hoje pelo Manel antes de subir ao palco. Em tom de despedia ouvimos os Pluto confessarem que são uma prisão de que fogem e a que regressam. Mais poético era impossível…

Seguem-se apresentações (não que fossem precisas), uma gigante ovação e vários agradecimentos. Os Pluto saem de cena.

Toda a gente naquele (lotadíssimo) descampado continua a aplaudir e a assobiar para um palco vazio, a pedir incessantemente por “mais uma” durante vários minutos, até que o Manel volta num salto (literalmente num salto) para o palco. Dirige-se ao público, mais em específico a um fã nas primeiras filas, dizendo que “o seu desejo é uma ordem!”

O encore traz-nos uma nova surpresa, um inédito de seu nome “O teu papel”, e mais dois ataques de nostalgia: “Líderes & filhos lda” e “Algo teu”. Numa altura tão derradeira do concerto, os versos “Para ti tenho um plano melhor” e “Vais ter de arranjar outro deus” doem que nem facadas certeiras nos nossos corações já tão habituados ao luto musical.

Seguimos (sem vontade nenhuma) para a última estação desta saudosa viagem pelo universo Pluto, com uma das mais curtas, e ainda assim, mais belas canções desta banda. “Algo teu” fecha este regresso num encantamento tal que até parece que voltamos á Aldina.

“Algo vosso” ouvimos dizer o Manel antes dos Pluto agradecerem e saírem.

 

E o nosso coração volta a remendar-se.

Estamos prontos para outra.

Mas não nos façam esperar mais 15 anos!

 

 

Reportagem: Mariana Couto

Fotografias: Carlos Martins

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