Os Ecos dos Cigarettes After Sex no hard Club

A “World Tour 2017-2018” dos Cigarettes After Sex iniciou-se na Eslováquia a 11 de agosto de 2017, tem fim previsto para Melbourne a 6 de janeiro de 2018, com passagem pela Ásia, América, Europa e Austrália, e a 25 e 26 de novembro de 2017 marcou presença no Vodafone Mexefest em Lisboa (ver galeria de fotografias aqui) e na Sala 1 do Hard Club do Porto.

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A Glam Magazine ficou intrigada com a rapidez com que a sala portuense foi insuficiente para satisfazer a procura persistente dos interessados, e foi verificar em que medida um recinto fechado contribui para a prestação da banda que ocupou o pôr do sol do palco principal do Nos Primavera Sound 2017.  O projeto Cigarettes After Sex foi parido em 2008 por Greg Gonzalez nas escadas da Universidade do Texas. Na sequencia do primeiro EP foi deslocalizado para Nova Iorque, e os atuais músicos substituíram os restantes fundadores. A composição é de uma simplicidade desconcertante, que lhe permite aconchegar-se na intimidade repousada que o nome sugere. Não inventaram a música pós-sexo, mas depuraram-na até a apresentarem nua e a segurar um cigarro vintage.

O quarteto entrou no cubo em lento sincronismo com as 22:00 horas, as silhuetas negras recortadas pelos projetores em contra luz a confundirem-se com a imagem monocromática de uma fiada de casas inertes sob o cair pausado de flocos de neve. Nenhuma cor para além do preto e branco, que incorporam a ausência ou somatório da policromia. Nenhum movimento para além dos indispensáveis.

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Nenhuma interação. Básico e tremendamente eficaz.

O burburinho recolheu-se em silencio, e “Sunsetz” ocupou-o sem preliminares. A música assumiu-se como líder de um conceito estético mais abrangente, em que o minimalismo é elevado ao seu expoente máximo. A iluminação recolheu, e uma imagem estática de fumo acompanhou o desfiar de “Starry Eyes”. Nenhum dos artistas fez qualquer gesto que não fosse imprescindível ao seu desempenho, como se um mero descer das pálpebras pudesse perturbar o impacto sensorial.

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Seguiu-se “I’m a Firefighter”, com a voz andrógina de Greg pousada sobre a cadencia uníssona da bateria de Jacob Tomsky e do baixo de Randall Miller, quase sem interferência da guitarra. Os ritmos cardíacos baixaram até ao limite da sobrevivência para se adaptarem ao tempo pausado e constante. O torpor foi interrompido por Greg a cumprimentar e anunciar “John Wayne”, que ganhou nitidez sobre a fotografia de um raio. Os primeiros acordes de “K” acordaram os écrans dos telemóveis, e um close up de rosto feminino materializou a Kristen, por quem o publico ajudou a chamar em sussurros cantarolados.

A belíssima cover de “Keep on Loving You” veio imediatamente atrelada, e instalou-se nos sorrisos hipnotizados que a multidão não teve tempo de desfazer. Seguiu-se “Sweet”, uma das mais bonitas melodias do álbum lançado este ano, e a demonstração sonora de que as fronteira do kitsch são tão plásticas como as emoções.

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“Opera House” foi encenada como um ritual iniciático, conduzido pelos movimentos elegantes dos braços estendidos de Jacob Tomsky, e escoltado pela linha descontinua do baixo de Randall Miller. A voz numa evidencia sacrificial de sustação coletiva de todas as funções cerebrais. O ambiente quase onírico foi rasgado por “Affection”, que despertou os reflexos pavlovianos de sacar gravadores de memórias fracas e entoar refrões orelhudos.

Em fundo deslizaram imagens distorcidas de uma igreja sépia. “Each Time You Fall In Love” trouxe de volta o que os Cigarettes melhor sabem fazer, os dedilhares de cordas que lhes são característicos, e o teclado de Steve Herrada a marcar os instantes exatos de cada inspiração ou expiração. O grande plano do rosto feminino com traços de Audrey Hepburn deu lugar a um plano mais afastado de uma jovem penteada à Lady Di, e trouxe o magnifico “Nothing’s Gonna Hurt You Baby”.

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O primeiro grande êxito da banda, que a atirou dos confins de El Paso para o mundo, e para uma noite em que El Paso e o mundo se reuniram no Hard Club. Greg fez a segunda e ultima interpelação à audiência para anunciar que terminaria com “Apocalypse”, acautelando alguma distração dessa previsibilidade. Passava milimetricamente uma hora do início do espetáculo quando os músicos despiram os instrumentos, renderam as set lists manuscritas à plateia, e abandonaram o palco. Retornaram para um encore a dois tons: “Please Don’t Cry” numa interpretação magistral reduzida a voz, guitarra e teclas, e “Yong & Dumb” com a formação completa.

Um concerto em slowmotion perfecionista, e que apenas deixa uma angustia – será que os Cigarettes After Sex ainda terão espaço para evoluir dentro do conceptualismo em que se encapsularam?

 

Galeria completa de fotografias para ver aqui

Reportagem de Ana Cristina Carqueja / Fotografias de Igor de Aboim

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