A cerca de dois meses do seu arranque, o 31.º Curtas Vila do Conde anuncia mais dois realizadores em destaque na seleção deste ano. Foco na secção Cinema Revisitado para o polaco Walerian Borowczyk, no ano em que se assinala o 100.º aniversário do seu nascimento, e na secção InFocus para o romeno Radu Jude, cuja filmografia tem percorrido com destaque os festivais de cinema nacionais e internacionais.
Conta-se que Walerian Borowczyk terá contestado o rótulo de surrealista que os críticos lhe atribuíram e que se revoltou quando o seu trabalho foi caracterizado como sendo erótico. Apesar da sua prolífica obra, que percorre o documentário, a animação, a publicidade, a curta e a longa metragem, Borowczyk continua a ser um mistério para a maioria dos espectadores de cinema. Homem de “imaginação fulgurante” (como o descreveu André Breton), nasceu na Polónia, mas foi em França que se afirmou enquanto criador. Ao longo da década de 60 criou mais de 60 animações, explorando os limites estéticos e técnicos da linguagem. Pintava comboios à noite para, de dia, embarcar e criar imagem em movimento; convidava amigos para eventos de live films, projetando película que havia pintado à mão. Estreia-se na realização profissional em 1957, ao lado de Jan Lenica, com Era Uma Vez, e dá o passo para a longa metragem com Teatro do Senhor e Senhora Kabal, em 1967. É, no entanto, com Contos Imorais, (1973, co-realizado com Fabrice Luchini e Paloma Picasso, e A Besta (1975), que o nome de Borowczyk chama a atenção de audiências maiores. Tirando partido do poder da alegoria (tão bem explorado nos seus trabalhos de animação), o “engenheiro do êxtase” – como haveria de ser apelidado – inicia-se aqui numa nova linguagem: que balanceia o erotismo e o kitsch e que entusiasma a audiência pela atmosfera que cada filme cria. Temas como intimidade, fantasias sexuais, a necessidade de arriscar e a negação do pudor passam a ser centrais na sua obra, num desafio a algumas das ideias mais conservadoras que ainda marcavam as sociedades da altura. O 31.º CURTAS apresenta um programa extenso da sua obra em curta-metragem, cruzando ficção, documentário e animação e exibindo filmes como Jouet Joyeux (Walerian Borowczyk; 3′, França, 1979) ou Street Art (Walerian Borowczyk, Jan Lenica; 1′, Polónia, 1957).
No verso desta moeda Radu Jude, nome que não deverá ser desconhecido para os atentos à cinematografia contemporânea. Vencedor da Competição Internacional do 30.º Curtas (com The Potemkinists) e dono de uma filmografia que equilibra o humor e a contundência, os filmes de Jude procuram experimentar novas formas de expressão que enquadrem, à lupa do seu século, temas intemporais como a liberdade, a igualdade e a fraternidade. Tendo como pano de fundo a realidade do seu país, a Roménia, a obra de Radu Jude encontra, com inquestionável facilidade, uma forma de romper com tabus, levando-nos pelo absurdo dos mal-estares sociais e a forma como os estados têm vindo a criar narrativas que nos distraiam dos seus erros e contravenções.
O 31.º Curtas dedica-lhe um programa especial focado no seu trabalho de curta-metragem, exibindo filmes como In the Morning (28′, 2007), The Tube With a Hat (23′, Roménia, 2007), Alexandra (24′, Roménia, 2008), Shadow of a Cloud (30′, Roménia, 2013), It Can Pass Through the Wall (17′, Roménia, 2014), The Marshal’s Two Executions (10′, Roménia, 2014), Punish and Discipline (12′, Roménia, 2019), Plastic Semiotic (22′, Roménia, 2021), Caricaturana (9′, Roménia, 2021), The Potemkinists (18′, Roménia, 2022) ou Memories From the Eastern Front (com Adrian Cioflâncă, 30′, Roménia, 2022