Carminho e a intimidade de “Maria” no Coliseu Porto

A noite de sexta feira no Coliseu ficaria marcado pela intimidade de “Maria”, ou melhor de Carminho com as canções de “Maria”, um trabalho mais intimista e denso, longe do tributo a Tom Jobim editado em 2017.

Após um início longo com vários temas e diferentes estilos como música de fundo, ainda com a cortina encerrada surge Carminho no centro do palco iluminada por uma lâmpada vermelha que oscila empurrada pela artista durante as primeiras músicas, criando a intimidade que se procura em “Maria”.

O meu nome é Maria do Carmo. Maria como tantas Marias por esse Portugal fora”, é desta forma que Carminho se apresenta. “O meu nome não é Maria do Carmo mas sim Maria José sou tuberculosa e corcunda. Como as pessoas são maldosas eu não saio de casa e fico a janela a cuscar a vida dos outros. Aqui no Porto isso não acontece pois não?” O público ainda ‘a frio’ reage num tom baixo e Carminho pede ao público para não a deixar mal!

Carminho quer partilhar a intimidade do seu disco com o público, e para isso escolhe a canção “Bom dia, Amor”.

“Um dia a janela apareceu um senhor que me faz borboletas na barriga e acho que a corcunda se mexeu”. Sei tudo sobre ele os fatos que usa mas ele não faz ideia que eu existo. E todos os dias eu lhe digo “Bom dia Amor …” Interrompe a música e pede ao público para os apaixonados darem as mãos. No Algarve os homens só dizem uma vez os sentimentos.

A primeira vez que o refrão “Bom dia Amor” foi cantado pelo público e segundo a fadista “foi bonito mas foi péssimo!”, tendo Carminho em tom divertido referido “Não vale começar a beijar que eu preciso da boquinha”. O público redimiu-se e à terceira tentativa, Carminho aprovou o refrão cantado pela sala.

“Vou cantar uma canção Muito especial que fiz para este último disco”, desta forma introduz o tema “Quero um cavalo de várias cores”. “O amor ensina o caminho sem dizer o caminho. O amor não fica com o crédito de nos ajudar a traçar o caminho”.

 

Deixando de lado as canções mais intimistas, soltam-se os primeiros acordes da “Sete Saias” tendo o público reagido e acompanhado o ritmo batendo palmas, palmas essas que foram continuas, sobretudo durante o refrão, mostrando que o público do Porto, afinal é ritmado e já tinha perdido a timidez inicial.

“É só água, enquanto bebe um gole. Dizem que o vinho seca mas com tanta gente a minha frente até dava jeito”.

No alinhamento surge a canção oferecida por Marisa Monte, “Chuva no mar”. “A Marisa e o Arnaldo perguntaram o que sentia quando ouvi esta música. Eu disse que cada segundo a nossa vida muda e eu pensei nós podemos mudar a cada segundo pareceu-me matemática simples. Nunca é tarde para mudar há sempre uma porta aberta. O nome da canção e giro porque muitas vezes chove no mar e ele fica maior mas nós não vemos. E é bonito”, rematando assim a introdução do tema.

Segue-se o “Pop Fado” no alinhamento e as palmas voltam-se a ouvir no Coliseu acompanhando a música, tendo a canção arrancado a maior ovação da noite. “Quem acham que escreveu esta música? o Miguel Araujo??”, pergunta ao público. “Pop Fado” foi escrita em 1966 e interpretada por António Calvário, mostra que o fado está em constante evolução.

Na parte final do concerto, “Pexincha” servir para que os músicos que a acompanham, brilhassem no domínio dos seus instrumentos com um dedilhar impressionante, tendo obtido o reconhecimento do público, que por várias vezes se fez ouvir por entre o som das guitarras. Carminho sentou-se no meio dos músicos ficando a apreciar o som que ecoava pela sala.

 

Em “Marcha de Alfama”, e com o público conquistado, abeirou se junto do mesmo deixando as marcações de palco bem para trás, aproveitando para bailar ao som da Marcha. Carminho aproveita para enaltecer a sala, sentindo sempre uma grande emoção que é cantar um disco ao vivo. “Esta era uma grande viagem das várias Marias mas nem sempre podemos desvendar tudo o que queremos sobre as músicas. Há uma coisa que aprendi são importantes duas pessoas para uma noite de fado nós e vocês. E vocês são sempre diferentes. Há uma influência grande e não posso deixar de agradecer o vosso respeito e o vosso empenho”, remata.

A luz baixa iluminado apenas o rosto e parte do peito em “Rosas” conseguindo criar um momento íntimo com o público apesar da grandeza da sala. O público aplaudiu de pé. Após a saída de palco começam se a ouvir os primeiros assobios sem que nunca as palmas tivessem abrandado o ritmo.

“Enquanto vocês ficarem nós também ficamos pois gostamos muito de cantar”, é com esta frase que Carminho regressa para o encore.  “É uma benção ter quem nos ouve…”

Já sem alinhamento no encore (“Agora já não estou preocupada” diz), Carminho escolhe um corrido, “O fado das horas”, para inicio do encore. Do público alguém grita “Sra da Nazaré” e a fadista atende ao pedido. Termina o encore com “Escrevi teu nome no vento” agradecendo mais uma vez ao público do Porto

 

No final, Carminho agradece novamente olhou para os músicos e disse que ia cantar mais uma. “Olhem que ficamos cá toda a noite…  Quem tiver que sair que saia”. Dedica a derradeira canção à mãe que está no Chile (“Já me ligou a perguntar se estava a correr bem e eu respondi que ainda não tinha começado”). O poeta fala sobre a palavra penas das aves e das nossas. É por isso que canto todos as semanas as penas para tentar encontrar. Acho que eu encontrei as minhas a cantar. Apresenta assim a derradeira canção da noite, “As minha penas”.

O som das guitarras baixou e um silêncio ensurdecedor apenas interrompido pela voz da Carminho que arriscou cantar sem ajuda do sistema de som tomou conta do Coliseu num momento de completa entrega. Depois disto a artista abandonou o palco e o publico já não teve coragem de pedir mais.

 

Carminho foi acompanhada em palco por Luis Guerreio, Flávio César Cardoso, Pedro Geraldes e Tiago Maia

 

Alinhamento:

Tecedeira

O Começo

Desengano

O menino e a Cidade

Saia Rodada

Se Vieres

A mulher Vento

Bom dia Amor

Disse-te Adeus

Poeta

Meu Amor marinheiro

Quero um Cavalo de várias cores

Estrela

Sete Saias

À Beira do Cais

Porquê

Chuva no Mar

Pop Fado

Pexinhcha

Marcha de Alfama

Rosas

Escrevi teu nome no vento

Reportagem e Fotografias: Júlia Oliveira

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