Spiralist ao vivo em Maceda… À terceira é de vez!

Já se passaram 6 anos desde que Bruno Costa, profundamente marcado pelo fim da banda que tinha criado na sua adolescência, e na qual atuava até então, decidiu enveredar pelo formato de one man band, e criar Spiralist. Muita coisa aconteceu nesses 6 anos. Muita mesmo!

Dois álbuns. Dois EPs. Vários videoclips. Muito merch. CDs e até mesmo cassetes! Novos amigos a juntarem-se a Bruno completando a metamorfose de Spiralist de projeto a solo para banda. A saída de alguns amigos para a entrada de outros amigos. Tudo aquilo a que, qualquer banda rock que se preze, tem direito. Infelizmente, só houve mesmo uma coisa que não aconteceu com o decorrer dos anos para Spiralist: concertos! Neste aspeto em concreto, o azar parece não abandonar a banda portuense. Foram precisos 5 anos para, em 2021, darem o seu primeiro concerto no Metalpoint (Porto). Seguiu-se uma série de cancelamentos e adiamentos até que em Fevereiro deste ano aconteceu, no Barracuda – Clube de Roque, o segundo. É certo que houve uma pandemia e um confinamento, todos sabemos, mas existe uma quantidade limite de tempo que uma banda aguenta sem pisar um palco… Por isso mesmo a expetativa (e a vontade) estavam todas em altas!

Desta vez não foi na Invicta, mas em Maceda, mais especificamente no bar “On The Rocks”, que a magia voltou a acontecer. (facto que, como vizinha esmorizense que sou, me encheu de orgulho, devo confessar) O cartaz foi dividido com os também portuenses All Kingdoms Fall e os (tal como eu vizinhos, de Oliveira de Azeméis) Soul of Anubis.

Pouco passava das 22h quando o “On The Rocks” começou a encher. O público vestido de preto dos pés á cabeça, os cabelos compridos, as tatuagens, os piercings, as rendas e as correntes, os copos de cerveja e o cheiro a tabaco não deixavam dúvidas: o Metal tinha chegado a Maceda… Em peso!

Coube aos All Kingdoms Fall fazerem as honras da casa ao estrearem o palco. O curto set (aproximadamente 30 minutos para cada banda, com exceção dos cabeça de cartaz) não foi desculpa para esta banda de hardcore não dar um espetáculo incrível. Sem nunca sair do seu registo frenético e envolvente (foram várias as vezes que o vocalista fugia do palco para se misturar e gritar com o público), os portuenses conseguiram em meia hora, mostrar ao público o seu som (e atitude!) que vivem tanto do agressivo como do humano. Respect!

A noite terminou, em alta, com os Soul of Anubis, que fizeram bem por provar o porquê de serem os cabeça de cartaz. Os barulhentos aplausos e os repetidos pedidos por “mais uma” (foram os únicos a ter encore) não foram apenas fruto desta dupla de sludge metal estar a jogar praticamente em casa… Com o set mais longo de todos (e provavelmente a audiência maior também) a banda deu um concerto brutal e vibrante que deixou toda a gente rendida. Mantendo sempre uma energia contagiante e um ritmo (oferecido pelas poderosas bateria e guitarra) incansáveis até ao último segundo. Impressionante esta dupla!

Mas sejamos honestos, não foram os All Kingdoms Fall nem os Soul of Anubis que me levaram ao “On The Rocks” naquela noite. Foram felizes descobertas! Sem dúvida! Mas não foi por eles que eu fiz a (ainda que curta) viagem a Maceda. Não!

A razão pela qual eu tirei o merch todo (e o leather jacket) do armário tinha outro nome: aquele que vinha no meio do cartaz.

Depois de, com a ajuda dos vários membros dos All Kingdoms Fall, desmontarem o palco anterior e montarem o seu próprio set (exemplos de camaradagem que só se encontram no underground) eis que chegou finalmente o momento pelo qual os Spiralist tanto aguardavam.

Os portuenses conseguiram, em 45 minutos, oferecer ao público exatamente aquilo que o público queria, e passar por toda a discografia, não deixando um único disco para trás.

O concerto abriu, em grande, com a imponente “Sun Ra”, o primeiro single do mais recente álbum “Eternal Recurrence”. Uma música que nos vicia tanto musical como poeticamente. (Welcome to Spiralist! That’s what they do.) Desde a chamativa bateria da intro, á guitar battle (que leva os fãs mais antigos numa repentina e nostálgica viagem no tempo a uma certa “White Night”), até á auto-consciência de versos como “I’ve got wounds to heal” ou “I’m still yearing for a life-changing event but maybe first it starts inside of me”. Sem nunca esquecer os catchy “Come Hear! Come Hear!” que, ao vivo, são impossíveis de não gritar, em coro com o Bruno, a plenos pulmões!

Depois da Boa Nova anunciada, seguimos viagem, desta vez para “THE FUTURE EP”, lançado no último ano, com o tema “Deus Ex Machina”. Nesta música o Bruno troca a guitarra pelos teclados e a timidez por power. Para os fãs que já seguissem o trabalho do Bruno para além dos 6 anos de Spiralist este foi O momento do concerto! Existem vários aspetos que se mantiveram intocáveis com o passar do tempo. Mas a presença em palco não foi um deles… Ele faz headbanging, ele quase que se atira para o chão em espasmos violentos, ele passeia-se pelo palco (ainda que não tenha muito espaço para o fazer), ele brinca com o micro (de uma forma que me faz lembrar o “Joe Talbot” dos “IDLES”), e ele interage com o público. Este não é o Bruno, este é Spiralist! Só foi pena o som não acompanhar a qualidade da performance… Too much reverb. Não deixa de ser irónico que tenha sido precisamente neste tema que a banda tenha sido traída pela “machina”…

Embalados por um harmonioso interlúdio passamos para outro EP e para a sua faixa homónima “The Church Dyed Black”. Coincidência (ou não) a guitarra que Bruno escolhe agora é preta, e esta escolha parece-nos mais do que adequada. Com ela, dá voz ao, tantas vezes abafado, tema dos abusos sexuais praticados no seio da igreja católica.

Em mais uma interação com o público, Bruno anuncia que com o próximo tema regressará aos clássicos, referindo-se ao seu álbum de estreia “Nihilus”. A música eleita é “Blood Moon”. Aproveitemos esta música para redirecionar o foco (que até agora tinha estado apontado ao Bruno) para os demais Spiralist. Que merecem, e de que maneira, partilhar holofotes. Durante os minutos que fizeram este tema em particular, tanto o baixo de Nuno Lobão, como a bateria de José Soares, e a guitarra do estreante Tiago Pereira (que fez mega headbanging em contínuo durante todo o tempo em que solou) sofreram nas mãos dos seus donos, tal era a entrega eletrizante com que estes os atacavam. Entrega essa que resultou num momento verdadeiramente hardcore envolto numa força contagiante.

O que é bastante curioso, já que o “Nihilus” foi inteiramente concebido por Bruno quando Spiralist era ainda um projeto individual. O facto de José, Nuno e Tiago brilharem tanto, numa música na qual nunca chegaram a estar envolvidos, só prova a enorme qualidade destes músicos.

Com os pés ainda no passado, eis que somos, de repente, catapultados de novo para o presente, mais em específico, para o tema que dá nome ao novo disco “Eternal Recurrence”. Um baladão que nos leva, logo aos primeiros acordes, para a praia onde seu videoclip foi gravado. Por motivos de ordem prática, a versão interpretada, ao vivo, por Spiralist é a versão “radio edit” que conta com uma diferença de 10 minutos para o seu original. Mas não foi só a duração a ser alterada, também a instrumentação é diferente.

Para surpresa do público, eis que Bruno escolhe, para esta música, não a guitarra eletroacústica de que estávamos á espera, mas sim a mesma guitarra elétrica, que vinha a usar nos últimos temas, mas desta vez tocada com arco (qual “Jimmy Page”) Um pormenor que nos aguçou a curiosidade e que elevou toda a fasquia da noite. Provando o versátil artista que é, Bruno manteve o registo da “Fender” com arco, chegando mesmo a solar, durante quase toda a música, e só o largou para mais um solo, desta vez mais tradicional, “só” com dedos. (agora até parece fácil). Nesta altura o entusiasmo está, compreensivelmente, em alta, e já toda a banda se encontra sincronizada numa partilha conjunta de vigorosos headbangings. A festa só termina quando Bruno dá um salto final, com a guitarra em mãos, como que para avisar que ainda há mais uma música para tocar.

Antes da derradeira música, Bruno volta a falar ao público, desta vez para agradecer. Agradece aos Soul of Anubis, que depois de saberem que o concerto de Spiralist do dia anterior tinha sido cancelado, se dispuseram a perder uma música do seu próprio set para que eles poder tocar mais tempo (again, gestos de solidariedade que só se vêm no underground).

O concerto acaba com um regresso ao futuro (EP) com a “Apocalypse Song”. Tema que nasceu do desafio lançado pelos The Armed, no início da pandemia, no qual a banda disponibilizou, para livre download, a sua inacabada música “Apocalypse Song” para todos aqueles que a quisessem terminar. Aproveitando a oportunidade, a banda portuense fez exatamente aquilo que os americanos pediam: utilizando samples do tema original misturados com música composta por Spiralist, criaram uma inovadora colaboração. Uma música tão especial não podia faltar!

Bruno dá início á despedida, engenhando uma série de industrial noises nos seus teclados (que ataca violenta mas cirurgicamente), e segue cantando, sozinho, todas as vozes existentes neste tema, passando de uma voz melodiosa e limpa para uma voz harsh quase grunhida como se nada fosse. A sua performance continua spotless, desta vez marcada por constantes headbangings em total sincronia com a batida da bateria. O noise final é agora feito, por Bruno, usando o microfone, seja com pedais ou com as suas próprias mãos, e a música termina, de forma epopeica, num gigante grito gutural.

Os muitos aplausos e assobios que ouço, como resposta ao que acabou de acontecer, levam-me a pensar que se mais tempo houvesse mais músicas eles tocavam e mais músicas o público ouvia.

Next Time!

 

Esperemos é que esse time chegue depressa…

Que isto é demasiado bom para continuar trancado em estúdio…

Reportagem / Fotografias: Mariana Couto

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