“Ninguém Nos Vai Tirar o Sol” o regresso de Joana Espadinha

Quando adotámos o lema “vai ficar tudo bem” no início da pandemia, o optimismo parecia uma boa arma contra uma catástrofe coletiva temporária. O que não sabíamos era que ainda estávamos longe de chegar ao fim daquele arco-íris. O título do novo álbum de Joana Espadinha surge como a frase certa na hora certa. Não sabemos quando é que vai ficar tudo bem, por isso agarremo-nos ao que temos agora: “Ninguém Nos Vai Tirar o Sol”.

 

A pandemia surgiu a meio do processo de gravação e, num trabalho que já implicava muitas viagens interiores, o confinamento veio apenas trazer mais uma camada às suas reflexões. O tema-título tem, na verdade, muito mais a ver com a sua experiência como mãe: que mundo é este que recebe os nossos filhos? A inquietação é ainda mais evidente no tema mais assumidamente maternal: “Ninguém vem ao mundo a saber que mundo é que o vai receber”, canta em “A História do Pé de Feijão”, uma emocionante canção que embala sem adormecer, direitinha aos tímpanos da sua prole.

 

Mas a incerteza de uma mãe traz consigo uma inexplicável confiança: “baixo os braços e o mundo não cai”, canta enquanto flirta com o rock’n’roll no viciante “Dar Resposta”. Melhor do que qualquer life coach: as prioridades reorganizam-se e, perante uma realidade incontrolável, Joana Espadinha toma as rédeas da sua vida.

E, porque a linguagem do amor maternal se confunde muitas vezes com a do amor romântico, conseguimos encontrar neste disco vários bocadinhos de nós na relação com os nossos. Como no arrebatador “Quem Me Dera Saber Que Sou Feliz”: “Quem me dera ser um banco de jardim, para sentir o teu amor pousado em mim”. Quem nunca?

 

A magia da música de Joana Espadinha, na sua incrível simbiose com o produtor Benjamim, é que todas estas reflexões pessoais se tornam imediatamente universais através da sua pop de inspiração indie, ainda com resquícios do jazz que a formou e das memórias da sua adolescência – fresca, leve, dançável, mas nunca vazia de sentido. Nem um tema mais irónico como o palpitante “Mau Feitio” deixa de ser uma confidência cantada de coração na boca.

 

Ao terceiro álbum, Joana Espadinha está inteira. Pega nas suas inquietações e verga-as ao poder terapêutico da canção pop. “Ninguém Nos Vai Tirar o Sol” é um divã de tamanho único: serve-nos realmente a todos.

Ana Markl

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