Emoções e sensações provocadas pelos Festivais Gil Vicente prolongam-se (muito mais do que) até 10 de junho

A 35ª edição dos Festivais Gil Vicente prolonga o estremecimento até 10 de junho com a apresentação dos espetáculos “Solo” de Teresa Coutinho, “Um Quarto Só Para Si” de silentparty (Projeto CASA) e “Noite de Verão” de Luís Mestre, estes últimos dois em estreia absoluta, adivinhando emoções que perdurarão no tempo.

 

Após uma expedição interplanetária em “Cosmos“, onde, através do resgate da mitologia africana e da revisão de eventos históricos do passado, se questionou a humanidade e o caminho percorrido até aos dias de hoje; uma abordagem tropical ao universo de Tchékhov em “As Três Irmãs”, uma coprodução d’ A Oficina / Centro Cultural Vila Flor e criação vencedora da Bolsa Amélia Rey Colaço – iniciativa promovida pelo Teatro Nacional D. Maria II (Lisboa), A Oficina / Centro Cultural Vila Flor (Guimarães), O Espaço do Tempo (Montemor-o-Novo) e o Teatro Viriato (Viseu); e uma jornada delirante e transdisciplinar da Plataforma285, envolta pela mercantilização e o capitalismo dos afetos em “all you can eat”, o segundo capítulo desta viagem promovida pelos Festivais Gil Vicente começa já esta quinta-feira, 8 de junho.

 

É este o caminho que nos leva até “Solo“, a 8 junho, cruzando os territórios da pesquisa e da autobiografia trilhados por Teresa Coutinho. Expondo nesta criação a condição feminista que a caracteriza e a move, a própria tenta aferir de que forma o teatro e o cinema contribuíram para a construção de uma ideia de Mulher que a moldou ou que quis repudiar: tanto no que diz respeito à sua imagem como a uma ideia mais generalista de beleza, de sexualidade, de força e de vulnerabilidade; o que é que, a reboque destas influências, se viu obrigada a reservar ou expor; o que lhe foi transmitido pelas mulheres da sua família, através da sua grande mestria do silêncio.

 

O poder da nova criação e das sinergias resultantes de intensos trabalhos em rede como é exemplo o Projeto CASA (Espaço do Tempo, Teatro Louletano e A Oficina / Centro Cultural Vila Flor) apresenta-se em força com a estreia absoluta de “Um Quarto Só Para Si”, do coletivo silentparty, no dia 9 de junho, sexta-feira. Nesta edição em que o teatro também abraça exercícios experimentais e poéticos que propõem um olhar influenciado pela arquitetura do lugar, os silentparty colocam-nos a interrogação: como fazer um esboço de um edifício que permita a emancipação permanente dos corpos que o habitam, enquanto lhes devolve a possibilidade de uma existência em conjunto? A descoberta de outras possibilidades é assim ensaiada, propondo uma sobreposição dos modos de organização do espaço e dos corpos no teatro com os da arquitetura, acreditando que experimentar diferentes modelos de construção – de espetáculos e de edifícios – é um exercício de imaginação de sociedades possíveis.

 

Esta 35ª edição encerra com a “Noite de Verão” de Luís Mestre, outra estreia absoluta que nos é presenteada a 10 de junho (sábado), com o humanismo e o existencialismo a serem capturados como fonte inesgotável para a formação de um campo sensível. Aqui, dois millenials acabam de se conhecer, um homem e uma mulher que atravessaram duas crises assimétricas em dez anos: a financeira e a pandémica. Estão num Verão quente e querem sentir uma leveza acolhedora, intangível, algo que perderam precocemente nas suas curtas vidas. Aparentemente, falam de coisas banais, leves. Mas o que realmente querem dizer nesta criação inserida na Tetralogia das Estações (coproduzida por A Oficina / Centro Cultural Vila Flor, Teatro Municipal do Porto, Casa das Artes de Famalicão, Cineteatro Louletano, 23 Milhas, Cine Teatro de Estarreja, Teatro Municipal de Bragança e Teatro Nova Europa), aquilo de que verdadeiramente falam, voz e corpo, é sobre as suas ansiedades e os seus medos.

 

As habituais e essenciais atividades paralelas do evento continuam a ser promovidas nos próximos dias pela mão do Teatro Oficina e do seu diretor artístico convidado (Mickaël de Oliveira), tocando a noção de ‘gesto artístico’ e aproximando público, criadores, intérpretes e equipas artísticas em momentos de conversa-pós espetáculos e debates. Esta semana, acontecem assim conversas após os espetáculos “Um Quarto Só Para Si” e “Noite de Verão”. 

Sendo facto que a noção de ‘gesto artístico’ tem animado a reflexão estética, ética, moral e, de certa forma, ontológica das artes no ocidente, com ênfase a partir do romantismo e com ainda mais escala no modernismo, é também ainda promovido o segundo de dois painéis de debate sobre a questão do gesto artístico, na tarde de 10 de junho. “Como apoiar a radicalidade do gesto artístico” dá continuidade à discussão para pensar os desafios que o setor das artes performativas portuguesas enfrenta no apoio ao aparecimento, visibilização e consolidação de novos gestos singulares, reunindo, juntamente com o público, os convidados Armando Valente (codiretor artístico do Citemor – Festival de Montemor-o-Velho), Bruno dos Reis (dramaturgo, encenador e diretor artístico do Grupo Experimental de Teatro da Universidade de Aveiro) e Teresa Coutinho (dramaturga e encenadora), aos quais se junta igualmente Mickaël de Oliveira (dramaturgo, encenador e diretor artístico do Teatro Oficina) na moderação deste segundo momento de encontro.

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