O Tremor regressa ao arquipélago entre os dias 20 e 24 de Março, novamente com uma rota de actividades culturais que prometem um diálogo contínuo e diverso com a paisagem. Da residência artística do rapper Mykki Blanco (na foto), que passa por São Miguel com objectivo de criar novas músicas, até ao espectáculo audiovisual de Aïsha Devi e Emile Barret, são 5 as novidades no cartaz de concertos desta quinta edição do Tremor. A estreia absoluta de Mal Devisa, projecto a solo de Deja Carr, neta do músico de jazz nova-iorquino Bruno Carr, e os regressos de Miss Red e Baby Dee, desta feita a solo e com concertos em nome próprio, completam a terceira leva de anúncios do festival açoriano.
Quando, em 2010, Quattlebaum lançava os seus No Fear, projecto ligado ao punk industrial, poucos conseguiriam prever que, anos depois, se assumiria como uma das figuras líderes do que o próprio apelida de “riot grrrl rap”. De um vídeo à liderança de um movimento catalogado mediaticamente como queer hip hop, o espaço que Mykki Blanco conquistou é terra fértil no questionamento do universo simbólico de um género marcado por ideias de machismo e violência. Polémico, provocador e inesperado, rapper, artista e performer, Mykki é sinónimo de transgressão no desafio aos temas e às imagens do rap como o conhecemos, trazendo-lhe novos contornos sonoramente mais próximos da electrónica e rebatendo preconceitos e conceitos de identidade. Nesta estreia em território açoriano, Mykki fará uma residência de criação que servirá para compor alguns dos temas do próximo disco.
Não há texto sobre Aïsha Devi que deva começar sem referência à Danse Noire, editora santuário, fundada pela própria, e que tem vindo a explorar o espaço abstracto do techno e da música de dança. É sob este selo que Devi tem transmutado a sua herança nepaleso-tibetana em electrónica que aspira a ser pura meditação. Desde o lançamento de “Of Matter And Spirit” que acompanhamos esta viagem espiritual pelas suas origens, onde os mantras pop que produz nos desafiam a descobrir o não visível, balanceando-nos entre paisagens sonoras industriais e ritmos dançantes. Numa resposta ao desafio lançado pelo Tremor, Devi volta a juntar-se a Emile Barret, num espectáculo multidimensional onde música e imagem se encontram.
A voz de Deja Carr é uma força da natureza, um instrumento de rara amplitude embebido numa espécie de empatia universal intrínseca, que remete tanto a Nina Simone, como a Billie Holliday. Cresceu entre o Bronx e a cidade de Amherst, num percurso pessoal que parece ter-lhe desenhado o enquadramento intelectual com que olha o mundo. Com densidade lírica pousada em instrumentação escassa, Carr é, ao mesmo tempo, a voz de uma cidade pequena e uma lâmina que escalpeliza os problemas sociais de comunidades fracturadas. Com Kiid, disco de estreia editado com o alter ego Mal Devisa, Carr ganhou a atenção de meios como Stereogum e Pitchfork como disco do ano, ao acordar-nos para músicas que têm a amplitude recursiva do jazz, do hip hop e do blues.
Há um atrevimento latente em qualquer aparição de Miss Red. Ficou conhecida quando, em 2011, “roubou o palco” ao mítico produtor The Bug durante um concerto em Tel Aviv. Nessa altura, já era um membro dos East Rider, a crew de profetas do reggae responsável por grande parte das movimentações em torno dos sound systems por todo Israel. Diss Mi Army, lançado com The Bug, em 2012, sob protecção discográfica da Ninja Tune, foi o bilhete de avião para a conquista mundial e para os amores públicos de nomes como Andy Stott ou Evian Christ. Nos últimos cinco anos, tem cruzado o globo ao lado de Kevin Martin ou com os seus 3421.
Estreou-se nos palcos nacionais no âmbito da última tour mundial dos Swans, num espectáculo que teve tanto de excêntrico como de desconcertante. No currículo, lêem-se colaborações com instituições musicais como Antony Hegarty, Current 93, Little Annie, Will Oldham ou Andrew W.K., que lhe granjearam o epíteto de ser uma das mais interessantes descobertas musicais da última década. Cantautora com formação clássica, Baby Dee é uma espécie de lenda do underground nova-iorquino no universo transgénero, juntando, num mesmo palco, o virtuosismo do entretenimento circense com um extraordinário talento na interpretação de piano, acordeão e harpa.