Despojada… Maria Gadú apresentou-se numa sala “chiquérrima”

A noite de segunda feira marcou o regresso de Maria Gadú à Casa da Música. Duas guitarras, um copo de água com gás, um copo de vinho uma cadeira, um piano de cauda Steinway & Sons e um projetor. Assim é o palco da sala Suggia, despojado como a música que nos iria ser apresentada. Vista de longe Maria Gadú, vestida de preto, parece um miúda de canelas franzinas e meias arco-íris, e com um gorro vermelho a tapar o curto cabelo loiro mas que não chega a tapar as orelhas.

´Shimbalaoe´ arranca o primeiro grande aplauso da plateia assim que tocam os primeiros acordes.

“Comecei a tocar em festas e casamentos e tem sido muito especial passear pelos lugares com uma estrutura e uma boa luz. E o bom de passear e que vou encontrando amigos por onde passo e ontem noite encontrei um amigo cá no Porto tomando copos e convidei para ele vir cá tocar” Maycon Ananias entra para a acompanhar ao piano.

Dada a cumplicidade dos dois em palco confessa que “a pouca da elegância que tem ganhou morando com essa pessoa” disse brincando, referindo-se ao pianista acerca da sua postura mais rígida.

 

Seguiu-se ´Long, long time´ canção composta em Nova Iorque com um amigo durante uma temporada que lá passaram. “Ao longo dos últimos anos tenho estudado antropologia e tenho resgatado muitas coisas giras sobre os povos indígenas. Me deu uma vontade de transformar esse formato de fazer música. Acho estranho isso de cobrar ingresso porque a arte é pública”.

Segue-se ´Um Girassol da Cor de Seu Cabelo´. “Rolou que eu estou com um depré na internet”, brinca. “Já deixei um monte de discos prontos uns 4”.Eu e o Michael só fazemos música triste.” Mas esta é uma música triste que conforta e nos leva para fora da nossa tristeza vivendo a tristeza dos outros através do escutar das suas palavras.

Assumindo a sua postura de ativista desabafa… “O Mundo está muito louco ou sou eu que estou muito louca “, numa referência a situação política atual. “E por isso que eu vou ouvir os povos indígenas, pois resistir 519 anos não é para qualquer um”.

 

Em ´Axé Acapella´, Maria Gadu dispara um discurso que fala dos diversos povos indígenas, do número de línguas indígenas, do amor livre “em nome do nosso direito de amar Bolsonaro não! … Lula Livre”

Em ´Amor de índio´, a artista lança um apelo para o final de ano e início do próximo que cuidemos melhor da mãe terra e que se use menos plástico e se coma menos carne… “O que desejo para todo o mundo é muita luz.“

O concerto termina acapella, o palco fica vazio e os copos meios cheios…

Maria Gadú regressa, sozinha, já no encore para apresentar ´Ne Me Quitte Pas´ de Jacques Brel. Neste momento a luz baixa, tornando se a canção (ainda) mais intimista.

Não deixou de lado a sua veia de ativista mais uma vez e relembrou o Cerrado que é e um dos maiores biomas do mundo e está ser queimado para produzir soja cheio de tóxicos, por sua vez usada para produzir carne. Voltou a referir olhando para o amigo Maycon Ananias , que entretanto tinha regressado ao palco, que só sabem fazer músicas tristes, enquanto alguém do público pede ´Altar particular´ ao que responde “é triste para caramba mas eu toco”… tendo referido no final é a música preferida da sua mãe “e ela fica brava porque eu nunca toca”.

Termina o concerto com ´Laranja´ que fez com que os pés quietos do público começassem a mexer ao ritmo da melodia. A vibração subiu até ao pescoço e já ninguém ficou indiferente acompanhando com palmas o refrão… “Muito obrigada Porto “

 

Não deixa de agradecer este seu regresso à Casa da Musica enaltecendo a sala… “Queira agradecer esse local chiquérrimo onde tudo soa bem e a equipa que técnica que me acompanha…. a toda a equipa da casa da Música deste quem limpa o chão a quem está na bilheteira” referindo que “quando compramos bilhetes estamos a alimentar toda uma cadeia”.

 

Obrigada Maria Gadú por tornares as coisas simples…

 

Reportagem / Fotografias: Júlia Oliveira

 

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