“Provador” chega aos Maus Hábitos em dia de aniversário

Em 2014, Tales Frey levou a cabo um trabalho intitulado “Vestido” – hoje parte da coleção do Museu Serralves – em que registou fotograficamente aquilo que perspetivou como sendo, simultaneamente, uma performance artística, um estudo sociológico e uma intervenção política. Nesta o artista, assumidamente interessado em questionar o que qualifica de “cisheteronormatividade compulsória” entrou em diversas lojas de artefactos de casamento e pediu para provar um vestido, registando reações, fotografando-se ao espelho, quando conseguia levar a cabo a tarefa, e fotografando o vestido na montra, quando isso não foi possível.

O projeto para a exposição “Provador”, com o apoio do Criatório, programa de apoio à criação do Porto, procura prolongar e expandir este gesto performativo recorrendo ao que poderá parecer apenas uma pequena variação: provar não um vestido de casamento mas sim sapatos de tacão alto.

Se uma primeira impressão poderia sugerir estarmos perante um simples prolongamento metonímico, quase óbvio, um segundo olhar mais atento às imagens e esculturas rapidamente nos indica estarmos perante um outro enquadramento simbólico, um diferente contexto pragmático, onde continuamos, sim, a sentir o poder das normas e dos preconceitos a serem curto-circuitados por um corpo “indevido”, mas agora numa outra cena, num outro espaço de desejo, numa outra forma de se fazer com que as convenções que reúnem corpos e indumentárias deixem de funcionar como se fossem naturais, porque sempre foram tudo menos coisas dadas na natureza.

O artista – homem cisgénero branco sul-americano –, ao transitar de loja em loja e ao tentar provar os sapatos de tacão alto, verifica como o sistema opera politicamente a favor de alguns padrões tidos como certos para determinados corpos, expondo a arbitrariedade das convenções, a violência sem escrúpulos da normatividade, dessa normalidade que se impõe aos corpos e aos seus múltiplos desejos de vir a ser e de poder possuir.

Será sempre, porém, parafraseando Paul B. Preciado, o exercício do sonho como da crítica ativa o que permitirá fabular e materializar outros destinos e outras formas e funções possíveis, pelos quais tanto se resiste como se conquista.

É este o exercício contínuo que Tales Frey, com a longa cumplicidade curatorial de Hilda de Paulo, propõe continuar, agora, mais uma vez, no mais famoso quarto andar de Passos Manuel no Porto de 6 de abril a 11 de maio e será acompanhada de programação paralela, que incluirá visita guiada em 10 de abril e visionamento de vídeos do artista, com a presença do mesmo, a 20 de abril.

A inauguração a 6 de abril coincidirá com o 25º aniversário do espaço Maus Hábitos, sendo acompanhado de performance “Achei ‘Achei Tendência’ Tendência” de Tiago Aires Ledo. No mesmo dia haverá concerto por @c + Rodrigo Carvalho, concerto com curadoria da Porta Jazz, o espetáculo “Colo”, um solo de Ana Deus, concerto do Quarteto Allegro com peças de Messiaen e Kurtag, finalizando com uma noite de clubbing reunindo todas as festas residentes.

Partilha