A Arte ganha movimento e ação no CIAJG

Entre 24 de abril e 13 de maio, o Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG) acolhe uma exposição com uma dinâmica invulgar. “Ação/Decisão” é uma exposição em que se mostra oque acontece. Os autores, artistas ou coletivos, habitarão o espaço e apresentarão, ao vivo, o seu trabalho no museu. O público vai poder confrontar-se com a obra dos ArthomemFernando Brito, Manuel João Vieira, Pedro Portugal e Pedro Proença – durante a primeira semana, depois com Vânia Rovisco e, na terceira parte, com João Fiadeiro e um grupo de artistas seus convidados. As três partes da exposição serão acompanhadas por três realizadores que vão criar o catálogo, desta vez fílmico, de trabalhos em que a relevância da transiência, do atrito, das tomadas de decisão e da ação serão agudizadas e vigorosamente problematizadas, por serem intrínsecas a esta experiência.

A primeira parte desta mostra em movimento acontece de 24 a 29 de abril, entre as 14h00 e as 19h00, e será protagonizada por Arthomem, coletivo de artistas, aos quais se juntarão alguns convidados. Conscientes de que, hoje, o performer é a sombra da sua expansão digital e que no mundo da super-gravação e dos acontecimentos onlinea performance torna-se ecrã em propensão interativa, os arthomens apresentam uma performance em que vão fazer filmar uma fábula que será simultaneamente gravada quer por uma equipa documental, quer por uma câmara que transmitirá em streaming. Perante a obsolescência dos statment que ornamentam o art world, estes artistas são como maestros que dirigem várias orquestras num diálogo reflexivo e desconcertante. Freud disse que o trauma e a neurose são repetição. Hegel e Marx que a história está destinada, pela mesma repetição, a ser uma farsa. O coletivo parte destas afirmações históricas para levantar algumas questões. O espetador torna-se assim o espetro da farsa da sua interação? E o performer? Perante isto a alternativa seria a festa. Em carne e osso?

Na segunda parte desta “Ação/Decisão”, a decorrer de 1 a 6 maio, das 14h00 às 19h00, é Vânia Rovisco que se lança para este palco para levantar questões trazidas por uma dassuas práticas profissionais mais recentes, nomeadamenteno âmbito do projeto REACTING TO TIME, portuguesesna performance. Talvez por viver no estrangeiro durante bastante tempo, esta artista ligada à Arte ao vivo apercebeu-se recentemente de parte da génese da Performance em Portugal e tem desde então investigado, muito através do seu corpo enquanto ferramenta, quais as possibilidades de transmissão das obras fundadoras da Performance em Portugal. Tirando proveito deste interesse e percurso da artista, o CIAJG procede a uma destas “transmissões”, simultaneamente aceitando a complexa problemática que se levanta no que diz respeito às questões de autoria, legitimidade, valor da documentação, identidade da obra, e várias outras. Neste caso, a escolha incidiu sobre a última performance de José de Carvalho, realizada em 1985 no estúdio onde estava a ser fotografado por Mário Cabrita Gil, e que se reveste de caraterísticas muito particulares e misteriosas.

 

Esta mostra artística a três tempos fecha com João Fiadeiro e alguns convidados que revelarão ao público o seu trabalho de 08 a 13 de maio, das 14h00 às 19h00. EXISTÊNCIAreprise retoma a experiência do projeto Existência, que João Fiadeiro criou em 2002 com estreiano Centro Georges Pompidou em Paris. A sua dramaturgia consistia em colocar os performers em frente a um público sem qualquer tipo de partitura, ao mesmo tempo que recusava a ideia de que se tratava de uma improvisação. Era uma Composição em Tempo Real, ou seja, uma composição (uma presença, uma duração) como outra qualquer, coma (enorme) diferença de que a decisão da direção, das relações criadas e do sentido dos acontecimentos, mesmo sendo definidas em tempo real, eram ensaiadas pelos performers até à exaustão e em função de critérios e premissas absolutamente rigorosas. Se os performers não sabiam ao que iam, o espetador tão pouco tinha acesso à informação de que aquilo que vianão era a repetição de uma peça previamente ensaiada.

Através de um olhar carregado de expetativa (de pré-conceito), João Fiadeiro dá a um acontecimento imprevisível a qualidade de um gesto inevitável.Existência movia-se na fronteira entre processo eproduto, obra e ensaio, ação e pensamento. É essamesma hibridez que João Fiadeiro convoca agora comesta reprise, expressão utilizada aqui no sentido que lhe dá Kierkegaard e que nos diz que “la reprise est cette “catégorie paradoxale” qui unit dans l’existence concrète ce qui a été (le “même”) à ce qui est nouveau (1’”autre”)”. Ou seja, não se trata de repetir o Existência, mas de retomar a sua dimensão irredutível: a experiência do desconhecido, do inacabado, do inesperado. A experiência da existência.

 

A exposição “Ação/Decisão” tem a curadoria de Mariana Viterbo Brandão. Luciana Fina está responsável pela curadoria do catálogo fílmico, que conta com os realizadores Filipe Bessa Viera, Joana Silva Fernandes e Raquel Teixeira, sob a coordenação de João Milagre da Escola Superior de Teatro e Cinema. O CIAJG tem atualmente à disposição do público a mais recente montagem da sua coleção permanente – “Teoria das Exceções – Ensaio para uma História Noturna” – e duas exposições individuais – “When Science Fiction was dead”, de Christian Andersson, e “Duplo Negativo”, de Miguel Leal – que propõem pensar o museu como uma grande máquina de viajar no tempo e de atravessar o espaço, que produz verdade e ficção, expõe significados ocultos e induz o visitante a uma nova perceção da realidade mantendo com esta uma relação criativa e inventiva.

Estas mostras expositivas podem ser visitadas até 10 de junho, de terça a domingo, das 10h00 às 13h00 e das 14h00 às 19h00. Aos domingos de manhã, a entrada é gratuita.

 

photo: Jorge Gonçalves

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