“Surdina”… o exercício a solo de Tó Trips

Se a imagem eterniza uma realidade que ainda se vive, eclipsada pelo desenvolvimento que escorre da cidade, o som salienta-a. Tó Trips encapsulou essas rotinas que ainda não se apagaram na banda sonora original de “Surdina”, que agora ganha forma física (e digital) num disco com o selo Revolve.

 

O resultado procurou encaixar-se na “tragicomédia minhota”. Num filme que trata da velhice, do amor, das memórias passadas e do que ainda resta para sonhar, de mãos dadas com o rural e popular.

 

Essas ideias transpõem-se para o disco, que arranca com “Tango Surdina”. Aqui, o compasso da guitarra clássica que ordena o tango encontra-se com a elétrica, cujo som recorda os Dead Combo, dos quais faz parte. Desta vez, sozinho, decidiu aventurar-se no piano — uma estreia para Tó Trips. Fê-lo de maneira a conferir o tradicional e popular, associação a essa velhice retratada no filme. O piano continua a marcar o registo na segunda faixa (“A Idade dos Pássaros”), vincando a camada nostálgica que a guitarra já carrega.

 

Como em “Ínfimas Coisas” e “Caminhada”, onde só há espaço para as cordas que se vão misturando e sobrepondo, num dedilhado que transporta o ouvinte (aqui mais do que nunca) para a memória sonora tradicional de um país. Debaixo das camadas criadas por esses instrumentos, surge, em “Fado do Manco” e “Rádio Cigano”, o acordeão, criando a atmosfera vigente em cada um dos temas: algo taciturna no primeiro, esperançosa na segunda (com a ajuda da percussão que se destaca pela primeira vez).


Num exercício a solo de Tó Trips, a banda sonora de “Surdina” parece contar uma história por si só — mas, acompanhando a imagem, nunca se sobrepõe a esta.

 

Photo: Raquel Castro

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