Shannon Lay traz “Living Water” ao Porto

De cabelo cor de fogo, Shannon Lay tem discretamente surgido como uma das forças criativas de maior destaque na folk de hoje. A pinta de punk-rocker não deixa esconder os ensinamentos do feedback e da catarse da sua banda, os Feels. Mas curiosamente esses elementos são também transportados para as canções do seu último “Living Water”. Da delicadeza que ascende em explosão ou da brutalidade que se desfaz em implosão, a guitarra e voz da própria gravitam sobre o que se pode efectivamente ganhar através de uma abordagem de simplicidade e de entrega. Despir pensamentos aparentemente complexos e apresentá-los, pele na pele, é um trabalho exigente em diversos níveis – e Lay parece ter essa consciência, em definitivo.

Porém, este é um resultado maior, de outros intervenientes. Deveremos aqui incluir Emmett Kelly, uma espécie de braço direito durante as sessões de gravação do álbum supracitado. Ele que já teve o mesmo papel ao lado de gente como Cairo Gang, Angel Olsen, Ty Segall ou Bonnie Prince Billy. O espírito irrequieto e pouco convencional de Shannon Lay encontra em Kelly uma base de descolagem perfeita. O ouvido apurado para o detalhe – e o que dele pode advir – acrescenta espaço para arranjos pontuais de contrabaixo ou violino (a recordar, por vezes, o saudoso “Dogs” de Nina Nastasia).

O transe do minimalismo das suas cordas são o leito ideal para a sua voz serpenteie a nossa imaginação com notas e versos capazes de nos desarmar sem estarmos à espera. Fá-lo com agilidade, ironia ou desafio, e por isso mesmo convence-nos, voltando a ela, repetidamente; como em busca de mais.
Dia 23 de Março ao vivo no Maus Habitos no Porto

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