SG Gigante é um projecto naturalmente ambicioso já que procura estabelecer uma ponte entre um dos mais celebrados cancioneiros nacionais e as novas gerações. Há 50 anos, Sérgio Godinho afirmava-se “Sobrevivente”, inaugurando com esse álbum que continha o clássico “Que Força É Essa” uma discografia que é uma das mais aplaudidas da música portuguesa, uma obra preenchida de canções que conquistaram os ouvidos de diferentes gerações graças a palavras que nos retratam a todos, que nos ajudam a definir a identidade e que são afinal de contas tão fáceis de cantar.
Capicua entende bem isso, ela que já dividiu palco com o mestre Godinho e que sempre o elogiou, em canção e em entrevistas. Por isso mesmo, a rapper do Porto coordenou uma expedição pela obra de Sérgio e o resultado tem vindo a ser desvendado, canção a canção. Porque todas são importantes nesta homenagem.
Em finais de Outubro de 1986, Sérgio Godinho lançou o seu décimo álbum de originais, “Na Vida Real”, um trabalho moderno, produzido por António Emiliano, um verdadeiro vanguardista, e com a participação de músicos de elite como João Maló, Carlos Guerreiro, Emanuel Ramalho ou Rui Veloso, prova então renovada de que o homem de “Lisboa Que Amanhece” sempre esteve disposto a trabalhar com a guarda avançada da nossa música. Nesse álbum, além do clássico olhar sobre o raiar do sol por cima do Tejo, havia ainda temas como “Isto Anda Tudo Ligado” ou “Pode Alguém Ser Quem Não É”, outras preciosas contas no seu generoso rosário.
“Não sei se dura sempre esse teu beijo”, começa por perguntar o próprio Sérgio antes de entrar um sample de uma gravação clássica, picada de vinil, que apresenta a cadência cozinhada com classe por Ride e onde se fala logo numa “Lisboa Mulata”. Chong Kwong, artista multicultural que carrega herança asiática e africana, oferece um outro olhar sobre esta Lisboa. E Eva Rap Diva, rapper que tem um pé em Angola e outro em Portugal, descreve a sua experiência na nossa capital, desenhando uma paisagem diversa. E no meio há o maravilhoso e melódico refrão de EU.CLIDES, que pega na dúvida sobre a durabilidade dos beijos expressa por Sérgio e a transforma em poética reflexão sobre o poder da noite e da vida.