A transformação do mundo pela dança prossegue com o GUIdance

A ambicionada mundança (palavra inexistente, surgida da ousadia de fundir a palavra “mundo” com a palavra “dança”, para gerar uma ação intencional: a mudança do mundo pela dança) continua a sua marcha a partir desta quarta-feira, 9 de fevereiro, com Sofia Dias & Vítor Roriz a apresentarem-se no Centro Cultural Vila Flor (CCVF).

A dupla de coreógrafos em destaque desta 11ª edição do GUIdance protagoniza o salto para a segunda semana do festival com Um gesto que não passa de uma ameaça, aqui apresentado numa remontagem do premiado e viajado espetáculo que em 2012 se apresentou em Guimarães, em plena Capital Europeia da Cultura, com os próprios a pisar o palco na interpretação deste espetáculo.

Como quando repetimos uma palavra até ela perder o seu significado, Sofia Dias & Vítor Roriz procuram neste trabalho situar-se nesse momento de perda e atribuição de sentido, de degeneração e transformação, indo ao encontro do modo caótico como a nossa mente percebe e associa acontecimentos.

O roteiro proposto pela viagem desta edição brinda-nos no dia seguinte com O Susto é um Mundo, peça de uma das mais reconhecidas criadoras nacionais da dança contemporânea, Vera Mantero, que aqui assume a cocriação e a interpretação com Henrique Furtado Vieira, Paulo Quedas e Teresa Silva, aos quais se junta ainda João Bento também responsável pela criação sonora. Vera Mantero e toda a sua equipa de criação inspiraram-se no psicanalista Carl Jung, no antropólogo Eduardo Viveiros de Castro e no professor de ética Jonathan Haidt para explorar tanto a ideia de contradição como a possibilidade da relação e da junção entre opostos, enquanto mecanismos de diálogo e de fricção.

Esta peça pode vista no dia 10, às 21h30, no CCVF.

O penúltimo dia desta edição do festival traz Cabraqimera, espetáculo de Catarina Miranda que nos cruza o olhar com um quarteto em patins que nos confronta com uma contemporaneidade simultaneamente física e tecnológica, onde um sistema de organização espacial, baseado em desportos de velocidade, estabelece um conjunto de códigos de ocupação, interceções e encontros. A dimensão plástica e hipnótica do gesto é aqui evidenciada por um sistema lumínico que revela espaços negativos e positivos, projetando o corpo para uma alteridade extrema e abrindo o terreno para a ficção. Cabraqimera é a peça de dança que pode ser assistida no dia 11, sexta-feira, pelas 21h30, na Black Box da Fábrica Asa.

O sábado, 12 de fevereiro, é o dia derradeiro da edição de 2022 do GUIdance, e proporciona-nos a oportunidade de contactarmos com duas criações com formatos bem distintos, desde uma performance a solo durante a tarde para uma atuação conjunta de 10 intérpretes à noite. Às 18h30, a jovem coreógrafa grega Anastasia Valsamaki apresenta na Black Box do Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG) a peça Body Monologue, interpretada pela bailarina Gavriela Antonopoulou, recuperando uma questão não respondida e evidente em palco: “o que pode um corpo fazer?”. Valsamaki centra-se na estrutura do monólogo, mas em vez de o verbalizar com significados, repele-os ao regressar ao silêncio pré-linguístico e eloquente do corpo que se expressa à medida que se move. Um silêncio feito de gestos, pausas, formas maleáveis e estados corporais desconhecidos que mobilizam o nosso olhar. Uma conversa oculta que substitui a rigidez dos significados verbais pela fluidez dos significados que o corpo consegue “falar” através da dança.

A terminar esta celebração (da potência) do corpo e da dança, o multifacetado coreógrafo (e também bailarino, realizador e fotógrafo) Wim Vandekeybus assinala o seu regresso ao palco do CCVF para apresentar Hands do not touch your precious Me a partir das 21h30. Neste espetáculo, o criador belga tece um conto mítico de confronto e transformação, luz e escuridão, morte e renascimento. Para a criação deste universo, o coreógrafo convoca, pela primeira vez, o performer e artista visual Olivier de Sagazan, cujo trabalho assenta na transfiguração do corpo e do rosto.

A exploração dos limites humanos de Vandekeybus e Sagazan encontra eco na entrega corpórea de oito magníficos bailarinos e na textura física e material da música eletroacústica de Charo Calvo. Juntos, apresentam-nos um submundo inspirado no mito da deusa suméria Inanna, povoado por esculturas carnais vivas, que pairam entre o utópico e o horrível, o poderoso e o frágil.

 

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