A antevisão à Glam Magazine de César Lacerda neste seu regresso a Portugal já na próxima semana…

César Lacerda está de regresso a Portugal já na próxima semana para 2 concertos: dia 17 no pequeno auditório do Centro Cultural de Belém, em Lisboa, e dia 25 na Casa da Música (Sala 2), do Porto.

A Glam Magazine esteve à conversa com o música Brasileiro em modo de antevisão deste seu regresso a Portugal.

 

1. A estreia aconteceu em 2011 com o EP homónimo e depois em 2013 com o álbum “Porquê da Voz”. Como tem sido essa evolução?

 

No meu primeiro álbum muito da minha personalidade musical já se esboçava: a ambição por uma música grandiosa e exuberante, de caráter um tanto barroco, o desejo de projetar e amalgamar a cultura do Brasil ao mundo, a intenção de me colocar como agente de mudança na música popular do meu país, enfim… Creio que isto se manteve nos discos seguintes, apesar de cada um guardar suas particularidades. É mesmo assim; a cada novo disco, uma nova dramaturgia, um novo norte estético. No entanto, mantém-se os grandes e primeiros desejos!

2. Pegando no nome do primeiro álbum, “Porquê da Voz“, é a voz o mais importante neste formato “voz e violão” que apresentas?

 

Gosto imenso da temática “voz”. Entendendo-a não apenas como algo específico do ”canto”. Mas mais profundamente, a “voz” como a expressão da unicidade de um autor. Como expressão daquilo que vocaliza um devir ontológico. Há, portanto, algo de muito íntimo neste formato “voz e violão”. Pois ele exacerba esta característica de uma expressão “vocal”. De uma expressão de autor. Apresento, nestes concertos, muito desta minha voz autoral. Está, à vista de todos ali, os traços mais verdadeiros de mim, da minha música. O que há de mais bonito e, também, as falhas, as arestas.

 

3. Neste formato as tuas canções, as canções de César Lacerda ganham mais expressividade?

 

Adoro este formato – apesar de, ultimamente, sentir um bocado de falta de mais gente comigo nos palcos! No entanto, percebo que desenvolvi, ao longo dos anos, uma assinatura muito particular. Muito minha. Fiz muitos concertos a solo. Entretanto, estar sozinho no palco é um desafio tremendo. Cada pequeno gesto se amplifica. Cada pequena respiração ganha contornos de expressão forte. É necessário muita concentração. Durante pouco mais de uma hora, preciso manter a atenção do público voltada exclusivamente para aquelas canções, para a trama que estou desvelando. E, por isto, é, sim, possível que as minhas canções ganhem mais expressividade neste formato.

 

4. César, quais os sentimentos neste regresso a Portugal? Sentes que o público Português acarinha os artistas Brasileiros?

 

Sempre soube que o público português adorava a música feita no meu país. Ainda além, que a conhecia com alguma profundidade. Eu, desde que vim aqui pela primeira vez, em 2014, tive a certeza disto. Senti na pele o carinho e a atenção. Este meu regresso guarda as mais belas sensações! Estou ansioso para apresentar-me nas salas onde realizarei os concertos. Será, de certo, grandioso!

 

5. Analisando a frase “Fundir a exuberância perfeita de um João Gilberto com a sedução de personagens mais populares como um Herbert Vianna. A busca por uma interpretação que evidencie a potência das canções é o norte deste novo show.”, o que podemos esperar destes concertos em Lisboa e no Porto?

 

Relendo está frase percebo que coloco-me um desafio tremendo! (risos)

Mas é mesmo esta a intenção. Está tudo dito aí! Unir o que há de mais elaborado com o que há de mais simples e direto. Buscar alcançar a perfeição e, ao mesmo tempo, deixar-se seduzir pela fragilidade da beleza mais rudimentar. É mesmo assim.

6. Atualmente o Brasil vive momentos conturbados e de alguma falta de liberdade, a música continua a ser uma forma de expressão?

 

O Brasil é hoje um país sob regime fascista. Governado por um grupo de homens (e algumas mulheres) perversos que ascenderam ao poder através de um golpe político. Destruíram a democracia e estão destruindo o país. Já há censura no país! Há a força das máquinas militar e judiciária a atuar ferozmente contra a população e as opiniões dissidentes ao governo. Ainda além, há uma guerra cultural que tenta instaurar pela força, goela abaixo, a mentira. Os artistas são alvo direto. Estamos na mira.

 

A música, bem como o teatro, o cinema, a literatura e todas as novas formas de expressão artísticas mantém-se resistentes e atuantes. Atentas. É exaustivo que seja assim. Mas é o que é.

 

Penso que o Brasil tem os ingredientes para solucionar muitos dos problemas do mundo. Mas há naquele país grupos reacionários muitos fortes, intencionados em destruir qualquer traço de avanço. E um dos traços mais radicais de avanço se deu pelas artes. Os artistas sempre sonharam para o Brasil um salto civilizacional que dá pavor a estes grupos que, claramente, projetaram o contrário: uma sociedade doente, em guerra, desigual, faminta, caduca, racista, misógina.

Estamos em guerra. É a triste realidade daquele lindo país.

 

7. Nos últimos anos muitos nomes têm surgido integrado em correntes da nova música Brasileira. O mercado musical no Brasil está em crescimento?

 

Eu, por acaso, acho que não. Acho que, apesar de termos hoje no Brasil um grupo de artistas muitíssimo interessantes em suas propostas artísticas, com força, a fervilhar em ideias e gestos expressivos, o mercado, por sua vez, está a amainar. Digo isto pois não consigo perceber como seria possível haver um mercado em crescimento se há uma guerra cultural a acontecer. Se a economia está completamente colapsada. Se a sociedade está completamente polarizada. Acho que a situação no Brasil é insuportável! Sinto muitíssimo em escrever isto.

 

O Brasil precisa romper de uma vez por todas com esta sina! Com este flerte com o autoritarismo. É urgente que se faça um movimento radical naquele país. E que voltemos aos trilhos.

 

8. “Tudo Tudo Tudo Tudo”, um disco com algumas colaborações. É a realização pessoal trabalhar com um conjunto alargado de músicos marcantes da MPB?

Amo a música do Brasil. Sua variedade tremenda, sua excelência, o desejo intrínseco de arrojo. A sofisticação que pode nascer tanto num apartamento de um bairro rico de uma grande capital e na favela vizinha, como no mais profundo e pobre sertão. Fui formado por isto. Para mim, nunca me pareceu possível fazer algo que deixasse de lado a importância de artistas como Caetano Veloso, ou João Gilberto, ou Gilberto Gil, ou Milton Nascimento. E daí, quando percebo que a minha carreira, por eventuais movimentos de colaboração artística, trisca a grandeza da obra de gente que admiro, sejam eles artistas mais antigos ou contemporâneos meus, noto que a caminhada faz sentido. Fico envaidecido.  

 

9. Ainda sobre o disco, “Tudo Tudo Tudo Tudo” que já data de 2017. Vamos ter novidades em breve?

 

Vim para Portugal para uma temporada de três meses. Senti que precisava sair do Brasil para compor. Precisava de paz para pensar em tudo. Pensar em mim. Pensar uma saída estética fora do colapso. Deu certo. Fiz já algumas canções por aqui. E tenho um esboço de um novo disco. No ano que vem, pretendo gravá-lo.

10. Tiago Nacarato tem marcado a agenda da música em Portugal. Como é que aconteceu esse encontro?

O Tiago ficou conhecido no Brasil pela sua atuação no programa The Voice. Assistir àquele garoto portuense lindíssimo, cantando muito bem a bossa-nova, com voz cristalina e quase sem sotaque de acento português, como se fosse nascido em São Paulo ou no Rio de Janeiro, fez despertar em muitos de nós uma atenção e uma admiração. Quando iniciei o trabalho com a minha manager cá, foi-me sugerido que realizasse uma parceria com algum artista de Portugal. E o nome do Tiago surgiu-me naturalmente. Fizemos a música pelo WhatsApp. Ele mandou-me a melodia e eu fiz a letra. “Felicidade é Só Querer” nasceu assim. Uma canção de amigos que desejam dizer que lutar por uma vida feliz, vale à pena!

 

11. Para além da faixa, “Felicidade É Só Querer”, que deram a conhecer, têm mais canções para apresentar juntos?

Nos concertos, iremos tocar juntos outras canções! Mas isto são surpresas para quem lá estiver!

12. Para terminar queres deixar uma mensagem sobre a tua música e os concertos no CCB e Casa da Música?

 

Faço música para encontrar-me com as pessoas. Para dizer-lhes algo sobre a vida que ainda não lhes ocorreu notar. Sinto que tenho algo a dizer ao mundo. Vim à Terra destinado a isso. Por isto, e ainda por tanto além disto, adoraria encontrar aquelas salas lotadas. Um tanto, claro!, pela vaidade de apresentar-me para uma vasta audiência. Mas mais especificamente, o meu interesse é apresentar-me para uma vasta e incrível audiência – característica essencial do público daqui! Portanto, se você ainda não garantiu os seus bilhetes para os meus concertos, faço aqui o meu convite e espero encontrá-los por lá! Até breve! Beijinhos!    

 

 

Entrevista: Paulo Homem de Melo

Fotografias: Daryan Dornelles

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